sábado, 3 de abril de 2010

América, Europa e um continente à escolha



O problema dos historiadores, pensa o fantasma da Princesa do Brasil, é que eles gostam exatamente daquilo que eu mais desprezo: o pó! Eu não queria nem sequer o pó daquela terra e aquela terra está cheia de gente querendo o meu pó. Carlota rendeu mesmo muito pó quando morreu; quis ser enterrada com uma coleção de sapatos, fato que a família ocultou por benevolência, e porque já tinham laços com loucos o suficiente; Maria de Bragança e Portugal era, afinal, a sogra de Carlota Joaquina. Que não queria nem o pó do Brasil, nem o de Portugal: menos ainda da França, e tinha Bourbon por duas vezes no sangue! Os historiadores, que são aliás uns fofoqueiros, uns podres, só queriam saber do pó de Carlota, deixem meu pó em paz! Não escavem minha sepultura. Era um tédio ser princesa do Brasil porque o Brasil não era propício para princesas. Era terra de gente gentia, suja, reclamona. Uns infelizes que só queriam saber de problemas sociais. Ninguém queria falar em casamento e tecidos novos. Menos ainda de sapatos. Não que eu fosse fútil assim. Carlota não era fútil, entendia muito dos problemas dos escravos e das infelicidades dos pobres, mas também me achava pobre! Pobre de espírito, veja que Carlota Joaquina, por ser mulher, não tinha voz na corte nem em lugar algum. Ela era um enfeite e se eu não me acostumasse a ser um enfeite o que seria da minha vida? Mas fui muito rebelde; Carlota sem dúvida deu muito trabalho, preocupou muitas cabeças, e mesmo assim saiu com a dela bem coladinha ao pescoço. Se não fosse um enfeite talvez pudesse ver aquela história dos pretos, porque eram mesmo muito tristes aqueles pobres pretos. Carlota Joaquina era uma das poucas soberanas que não eram racistas; mas, pensando bem, eu nem sequer era uma soberana. Princesa do Brasil. Bem certo que fui Rainha de Portugal um pouco, por pouco tempo, e fiz poucas coisas, umas traições, uns trâmites, causei lá alguns problemas; mas Portugal tem o tamanho do meu sapato e a sola do meu pé mede vinte e três centímetros, aliás media, porque Carlota está morta. E o Brasil muito devia a ela, muito devia a mim, porque veja, o Brasil era imenso, ainda é, está maior agora porque tem mais terra, e toda aquela terra devia ter ficado sob o meu comando e teríamos feito maravilhas, mas não me deixaram! Não podia mandar neles e não podia desmandar; no primeiro eu seria fútil, no segundo ela seria insuficiente. Se eu bebia muito era feio, e se não fazia nada eu não era nada também. E eu não podia ser nada, mesmo que o Brasil me tenha negado. Pois eu nego o Brasil também! Desta terra continuo não querendo nem o pó. Nesta terra quero que tudo se exploda e vire tão pó quanto eu! Brasil, Portugal, Espanha, França, todos os lugares que me negaram. Neguem Carlota Joaquina na morte! Eu espero só que a guerra destrua cada centímetro desse amontoado de lixo até ficar do tamanho da sola do meu pé e eu possa pisar nas gerações de reis e rainhas e príncipes e princesas que não me deixaram fazer nada.

2 comentários:

bruna disse...

tri mesmo é a propaganda da princesa paola, dos talheres da realeza de caras HAHAHAHHAHAHA sou retardada

Tangerina disse...

TU FEZ O DA CARLOTA JOAQUINA, CARALHO.

Já disse que te amo? HAHAHA

(aliás, vai passar no MaxPrime, dia 15 às 14h30min o filme "Carlota Joaquina", a quem interessar)

FICOU FODA. Como eu sabia que seria, aliás. Gente, o jeito de narrar foi MÁGICO. Lindo, lindo, lindo.

Rainha Júlia. ♥

 
template by suckmylolly.com