quinta-feira, 23 de setembro de 2010

The King's Beloved Sister

Eu não sou rainha porque sou feia. O motivo é esse. Eu sou feia. Não é que rainhas não possam ser feias, é que eu, que sou feia, não posso ser rainha. Posso ser a irmã do duque. Se eu tivesse nascido princesa, acabaria sendo rainha. Uma rainha feia. Que diferença faz? Mas quando se nasce príncipe a gente quer casar com as moças bonitas. Eu não o culpo. Não é culpa dele. É culpa minha ser feia, mas tudo bem. Tudo bem mesmo. Como irmã do duque, todos me achavam bonita. Eu gostaria de não viver entre os extremos. Como irmã do duque, eu era muito bonita e portanto não podia ou precisava de cérebro. Eu ainda não preciso. Ninguém me cobrava cérebro. Eu era bonita. Uma bela irmã-de-duque sem cérebro. Eu era bonita para os germânicos, penso. Sim, os germânicos vêem tudo diferente dos outros. Para eles eu era bonita, e para eles eu era estúpida. Para os ingleses eu também era estúpida. Desse estigma nunca me livrei. Estúpida. O problema é que eu podia ser estúpida em território germânico, pois era bonita para o Sol que nascia para nós; mas, na Inglaterra, como, além de feia, ser estúpida? Não quero falar de justiça. Também não quero falar de culpa. Eu não quero falar de nada; sou estúpida; e não sou rainha unicamente porque Henrique não me julgou suficientemente bonita. Tudo bem. Henrique foi um amante carinhoso. Agora acho que já posso ser sincera. Oras, é claro que o casamento foi consumado. Eu posso não ser bela, e posso não ser inteligente, e posso não atrair todos os olhares como a outra Anna atraía, mas por que Henrique não consumaria nosso casamento? Henrique era muito gentil. Eu não queria mesmo ser rainha. Eu vou admitir que o que me manteve viva e na Inglaterra por tantos anos foi uma fúria sem precedentes. Eu merecia mais. Eu acho que não dá para colocar uma coroa na cabeça sem criar um pouco de raiva. Eu não sei de onde surgiu, mas sei que assumi meu posto como a mais amada mulher do rei com uma dor que feria, não uma dor de quem lamenta, mas de quem quer fazer lamentar. Eu esperei com paciência e ódio. Eu posso não ser bonita; não sou bonita. Mas cerzi uma bonita tapeçaria sobre meus seis meses de rainha. Eu nunca tinha sido tomada por algum sentimento antes. Quero deixar claro que nunca me senti rejeitada. Eu acho que sou orgulhosa demais para me sentir rejeitada. Eu não sou rainha porque sou feia. Eu vivi todos esses anos porque não fui rainha. Todos os dias da minha vida, ajeito a tapeçaria. Mesmo que eu espere até meu último dia, nunca serei rainha. Eu não culpo ninguém. Acho que nunca realmente quis ser rainha.

Anna de Cleves, a Amada Irmã do Rei

2 comentários:

Tangerina disse...

É claro que, apesar da minha vergonhosa falta de história haha, adorei o texto. ♥


ah, você me explicou AHAHAH

Agora eu gostei do texto ainda mais, sério. Tadinha dela. Mentira. Gostei do sentimento de revolta. Tudo bem, talvez ainda esteja com um pouco de pena, mas...


Ah, Júlia, por que tu escreve tão bem? ♥

Diana disse...

Feia, talvez. Estupida? Nunca. Afinal, manteve a cabeça em cima do pescoço, saiu de cena com ela erguida, e seis meses depois de abandonada, entrou no salão real para encantar a todos com a graciosidade e animação que adquirira longe de Henrique.

Esperta foi ela, que tirou a coroa, não a cabeça. xD

 
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